Como estabelecer-se no Ser
(trecho do Capítulo IV do livro “Os Ensinamentos Finais de Annamalai Swami, de David Godman”)
Trecho do livro
“Os Ensinamentos Finais de Annamalai Swami, de David Godman”, cuja nova
tradução em português foi publicada em setembro de 2014. Detalhes
sobre a nova edição podem ser encontrados aqui.
Pergunta: Eu venho seguindo os ensinamentos do Bhagavan há muitos anos, mas
sem quaisquer benefícios aparentes. Eu não sinto paz alguma. O que é que estou
fazendo de errado? Por que não obtenho resultados?
Annamalai
Swami: A autoinquirição deve ser feita continuamente.
Ela não funciona se você a considerar como uma atividade de meio período. Você
pode estar fazendo alguma coisa que não prende seu interesse ou sua atenção,
então pensa: “Ao invés disso vou praticar um pouco de autoinquirição”. Isso
nunca vai funcionar. Você pode dar dois passos adiante quando pratica, mas dará
cinco passos para trás quando terminar a prática e retornar às suas ocupações
mundanas. É necessário um comprometimento de toda uma vida para estabelecer-se
no Ser. Sua determinação em ter êxito deve ser firme e forte, e deveria se
manifestar na forma de esforços contínuos, e não esparsos.
Você tem estado
mergulhado na ignorância por muitas vidas, e está acostumado com isso. Todas as
suas crenças profundamente enraizadas, todos os seus padrões de comportamento
reforçam a ignorância e fortalecem o poder que ela exerce sobre você. Essa
ignorância é tão arraigada, que está fortemente enredada em todas as suas
estruturas psicológicas, que é necessário um esforço sólido por um longo
período para livrar-se dela.
Os hábitos e
crenças que a sustentam têm que ser desafiados repetidamente.
A ignorância é a
ignorância do Ser, e para removê-la é necessário Autoconsciência. Quando você
alcança a consciência do Ser, a ignorância desaparece. Se você não perder o
contato com o Ser, a ignorância não poderá surgir.
Se existe escuridão,
você a remove trazendo luz. A escuridão não é alguma coisa real e substancial
que você tem que desenterrar e jogar fora. Ela é apenas a ausência de luz, nada
mais. Quando se deixa entrar luz num quarto escuro, repentinamente a escuridão
não está mais lá. Ela não desaparece gradualmente ou vai embora aos poucos; ela
simplesmente deixa de existir quando o espaço é preenchido pela luz.
Isso é apenas uma
analogia, porque o Ser não é como as outras luzes. Ele não é um objeto que você
vê ou não vê. Ele está aí o tempo todo, brilhando como sua própria realidade.
Se você se recusa a reconhecer sua existência, se você se recusa a acreditar
que ele está aí, você coloca a si mesmo em uma escuridão imaginária. Ela não é
uma escuridão real. É sua própria recusa intencional em reconhecer que você é a
própria luz. Essa ignorância autoimposta é a escuridão que precisa ser banida
pela luz da consciência do Ser. Temos que nos voltar repetidamente para a luz
do Ser dentro de nós, até que nos tornemos um com ela.
Bhagavan [Ramana
Maharshi] falou sobre voltar-se para dentro e encarar o Eu Real. Isso é tudo o
que é necessário. Quando olhamos para fora, nos envolvemos com os objetos e
perdemos a consciência do Ser que brilha dentro de nós. Mas quando, pela
prática frequente, ganhamos força para manter nosso foco no Ser, nos tornamos
um com Ele e a escuridão da ignorância do Eu Real se dissipa. Então, muito
embora continuemos a viver nesse corpo falso e irreal, nós habitaremos no
oceano de bem-aventurança que nunca desaparece ou diminui.
Isso não vai
acontecer em um instante, porque muitas vidas de pensamentos equivocados e
ignorantes tornaram impossível para a maioria de nós focar atentamente e
regularmente no Ser dentro. Se você deixar sua casa e começar a caminhar para
longe dela, e se esse hábito perdurar por muitas vidas, provavelmente você
estará bem longe de casa quando finalmente decidir que já chega, e que você
quer voltar para o lugar de onde começou. Não se deixe desencorajar pela
extensão da jornada, e não relaxe em seus esforços para chegar em casa. Vire
180º para voltar-se para a fonte de sua jornada exterior, e continue indo em
direção ao lugar de onde você começou. Ignore a dor, o desconforto, e a
frustração de parecer não estar chegando a lugar algum. Mantenha-se movendo de
volta à fonte, e não deixe que nada o distraia no caminho. Seja como o rio em
sua jornada de volta ao oceano. Ele não pára, se desvia, ou decide correr morro
acima por um tempo. Ele não se distrai. Ele apenas se move lenta e
constantemente de volta ao lugar de onde suas águas se originaram. E quando o
rio se dissolve no oceano, ele deixa de existir. Somente o oceano permanece.
Jiva [o eu individual] veio de Siva
e tem que voltar para Siva
novamente. Se houver uma grande fogueira e uma brasa incandescente pular para
fora dela, o fogo na brasa logo se extinguirá. Para reacendê-lo é preciso
colocá-lo de volta na fogueira, de volta à sua fonte candente.
Não existe
felicidade na separação. O jiva
não sente felicidade, contentamento ou paz enquanto ele permanecer um ser
separado. O ser separado surge do Eu Real. Ele tem que voltar para lá e lá
findar. Somente então haverá paz eterna.
A energia da mente vem do Ser. No estado de vigília a mente atua como
uma entidade separada. Durante o sono ela retorna à fonte. Ela aparece e
retorna repetidamente. Ela faz assim porque não conhece a verdade do que
realmente é. Ela é o Ser apenas, mas sua ignorância deste fato a faz miserável.
É este sentimento de separatividade que faz surgir os desejos, sofrimento e
infelicidade. Mantenha a mente no Ser. Fazendo isso você pode viver em paz
tanto acordado quanto enquanto estiver adormecido. No estado de sono profundo
todas as diferenças cessam. Se você mantiver a mente no Ser durante o estado de
vigília, também não haverá diferenças e nem distinções. Você verá tudo como seu
próprio Ser.Fonte:http://advaita.com.br/2015/02/27/como-estabelecer-se-no-ser/?
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