KOAN - RETIRO DE MEDITAÇÃO ZEN BUDISTA - MÁRCIA CÂNDIDO

 

Koan**

Por Márcia Cândido*
 
No silêncio da sala iluminada por velas e cheirando a incenso japonês, os monges, totalmente imóveis, e seus discípulos, meditavam. Com minha mente de principiante, eu tentava entender os preceitos e percorrer o caminho. Ao longe, ecoando da parte mais elevada do terreno, ouve-se o toque de um sino. O som de três badaladas chegam à sala silenciosa, onde o único ruído era o respirar sutil.Era o sinal. Mokusen San ia me receber. Levantei-me, silenciosamente, fiz as reverências e saí do zendô decidida a voltar trazendo todas as respostas, com a ajuda daquele que já tinha percorrido grande parte do caminho. Eu tinha o coração aberto para qualquer explicação, para aceitar todas as coisas, desde que viessem daquele estudioso budista.
Na varanda do mosteiro, respondo ao chamado e toco um sino outras três vezes, avisando que já estou a caminho. Vou só. Iluminada pela lua e estrelas, a trilha de pedras que leva à pequena choupana é contornada por lanternas de velas acesas, fixadas alternadamente no chão e espalhadas pela margem. A distância calculada entre uma e outra vela evidenciam a disciplina dos monges, que se entregaram à tarefa de iluminar o ‘caminho do Dokusan’, como eu gostava de me referir à trilha.
A noite é alta, mas não me assusta. As perguntas que me acompanham me incomodam muito mais, pois na ausência de respostas minha mente devaneia como borboleta sem pouso. Guiada pelas lanternas, chego, enfim, à humilde casinha amarela, de apenas uma sala, com uma porta e duas janelas pequenas, iluminada por velas. Com seu manto preto, sentado numa almofada no chão em posição de lótus, está meu mestre Mokusen, olhando na minha direção.
Deixo os chinelos do lado de fora e, antes de entrar, faço uma reverência em sinal de respeito. Ele retribui.
– “Acenda um incenso e ofereça à Buddha”, pediu calmamente, apontando o altar.
Obedeci.
“Sente-se”, ele fez o convite apenas com gestos, apontando a almofada no chão à sua frente. Acomodei-me.
Olhando nos meus olhos, ele perguntou calmamente:
- “Porque veio?”
- “Procuro respostas”. Fui tão direta, quanto ele em sua pergunta.
- “Não procure. Elas chegarão até você.”
- “Quando?”
- “No momento certo.”
- “E quando é o momento certo?” Insisti.
- “Quando você estiver pronta”, ele frisou.
Aquilo começou a me deixar impaciente. Pressenti, pelo rumo das respostas, que ia andar em círculos ou que me faria voltar ao ponto de partida mas, mesmo assim, insisti, recusando-me a sair sem respostas.
- “Quando estarei pronta?” Perguntei, novamente.
- “A fruta amadurece, nós a colhemos e comemos. Tudo tem seu momento certo, disse o monge, pausadamente. Quando você estiver pronta vai sentir as respostas, que já estão dentro de você, subirem à tona, como bolhas na superfície da água. Você saberá. Está ouvindo o grilo cantando lá fora? Sentiu a claridade da lua iluminando o céu escuro? E o vento? Está escutando o barulho que ele provoca na plantação? Ouça a sua voz interior, mas também ouça a voz da natureza. Todas as respostas estão aí.”
Sabiamente, ele dirigiu meu olhar para dentro de mim e mostrou-me que as respostas já estão prontas, guardadas, esperando apenas o momento certo para saírem do silêncio e se apresentarem. Entendi que só assim, podemos compreendê-las e aceitá-las.
De volta ao mosteiro, a lua, o vento, o canto do grilo e as estrelas tinham agora um significado diferente para mim. Não retornei com as respostas que esperava, mas me senti mais leve, ao saber que, para entender o caminho, é preciso, antes de tudo, caminhar …
… na paz!
Até nosso próximo encontro!
 
*Márcia Cândido é jornalista. Atua prestando assessoria de imprensa e em treinamentos para lidar com a mídia. Especialista em jornais empresariais, vê na comunicação um grande aliado para o sucesso de toda iniciativa.
 
Fonte:http://mokusen.wordpress.com/tag/retiro-de-meditacao-zen-budista/
 
 
**Um koan (公案; japonês: kōan, chinês: gōng-àn, coreano: gong'an, vietnamita: công án) é uma narrativa, diálogo, questão ou afirmação no Zen-Budismo que contém aspectos que são inacessíves à razão. O koan tem como objetivo propiciar a iluminação do aspirante a zen-budista. Um koan famoso é: "Batendo duas mãos uma na outra temos um som; qual é o som de uma mão?" (tradição oral, atribuida a Hakuin Ekaku, 1686-1769).

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