DA MAIS VALIA AO OBJETO A COMO MAIS GOZAR

 

DA MAIS VALIA AO OBJETO a COMO MAIS DE GOZAR

No bojo do movimento de maio de 1968 Lacan formaliza em seu ensino o conceito de objeto a como mais-de-gozar, dando uma guinada dos objetos a naturais, para os objetos de mercado, estabelecendo não como similar, mas como homólogo os termos mais-de-gozar (mehrlust), e o conceito que Marx faz de mais valia (mehrwert). 


Lacan prossegue nesta aproximação, afirmando ainda que o sintoma não deveria ser buscado em Hipócrates, mas em Marx na sua formalização de mais valia.

É na passagem do período pré capitalista, onde o mercado se estabelece ainda pela troca de equivalentes, ao período de ascenso da burguesia em seu novo edifício econômico, que podemos identificar a criação do sintoma. 

Lacan no Seminário XVI – De um Outro ao Outro, diz que o sujeito é aquilo que pode ser representado por um significante para outro significante e que isso seria calcado na descoberta de Marx de que o sujeito de valor de troca é representado pelo valor de uso. Tal troca de equivalentes, característico do período feudal, tem uma brecha, que cai com o advento do capitalismo, dando lugar a mais valia.

Na nova sociedade burguesa a condição de dominação e servidão típicas do feudalismo é recalcada. Marx trata da relação fetichista que o capitalista estabelece com as coisas, afirmando que as relações sociais entre indivíduos na nova sociedade capitalista disfarçam-se em relações sociais entre coisas. Daí o caráter fetichista do sintoma formalizado por Marx. O proletário, não mais na condição de escravo do senhor feudal, torna-se escravo de sua liberdade, ao vender livremente sua força de trabalho. Desprovido dos meios de produção, passa a ser mercadoria, e cujo uso produz mais valia, ou seja, o excedente que é apropriado pelo capitalista. A mais valia, como negação da troca por equivalentes, acarreta o sintoma, como um excesso de gozo.

Marx, em O Capital, estabelece as bases da teoria econômica de mercado, diferenciando-se de seus antecessores por identificar no valor da mercadoria, um excedente, sendo este da ordem de um excesso, é o lucro do capitalista. 

Eis aí a mais valia nas palavras de Marx:

“Toda mais valia , qualquer que seja a forma na qual se cristalize, é por sua substância, materialização de trabalho não pago, que é igual ao trabalho excedente da venda de mão de obra do proletário.”



      Mais Valia                       trabalho excedente              trabalho não pago
__________________ = ___________________ = __________________

Valor da força de trabalho     trabalho necessário                  trabalho pago 

Aí vemos a fómula de Marx da mais valia,
Na ágebra lacaniana se increverá da seguinte forma. 


          DM





O S1, o senhor, age buscando um saber no campo do Outro. Saber que é do escravo, pois o senhor nada sabe. O saber fazer é do escravo. Nesta operação, do significante mestre com o significante do saber, há um resto, da ordem o excesso, do objeto a como mais-de-gozar. 

Na formulação que lacan estabelece dos discursos, o objeto a, não se trata de um gozo “normal”, porque o gozo como está inscrito no laço social, só emerge de um excedente, sendo constitutivamente um excesso. O excesso necessário ao capitalista ao extrair o saber do proletário, que é a mais valia, excedente de trabalho.

Jacques-Alain Miller lembra que o objeto a é prioritário no campo da realização subjetiva, portanto na clinica e no laço social. Seria pois, todos os objetos a, inscritos nos quatro lugares dos discursos, mais-de-gozar?

A estrutura dos discursos estabelece o objeto a como mais-de-gozar. No discurso do analista, o objeto a se mostra como opaco, com efeito de rechaço, de recusa, mas também como objeto mais-de-gozar no interior da fantasia do analisante. No discurso do analista o que trabalha é o sujeito, ficando o saber suspenso.

         DA

No discurso da histérica o sujeito busca-se um significante que dê conta de seu gozo, não podendo dar conta do saber, evoca o mestre para dar conta do saber, enquanto deixa abaixo de si, o objeto a, como diz JAM, “como efeito de corte da linguagem no corpo”. É elemento causa de desejo. A histeria demonstra os objetos a naturais, mas quando estes mesmos objeto a naturais são postos no mercado pelo sintoma histérico, tais como as tatuagens, piercings, cirurgias plásticas, medicações, temos o objeto a como mais de gozar. Lembremos que é homólogo o mehrwert e o mehrlust, portanto todo objeto do mercado é objeto como mais-de-gozar. 

         DH






No discurso Universitário, o agente é o saber pleno, tendo o professor como representante deste saber, que se liga em termos ao discurso da ciência, coloca o aluno, chamado por Lacan de astudado, que já caracteriza sua posição como objeto a como mais-de-gozar, por “não ser mais que unidade de valor”. É o que se vê hoje, na mercantilização do ensino, onde o excesso (excesso de alunos, excesso de pagantes, excesso de universidades, excesso que busca sempre a lógica de mercado) que garante a mais valia é também a forma de gozo fetichista 

          DU





O mais-de-gozar, em sua relação de igualdade com a Mais Valia de Marx, permite isolar no laço social a função do objeto a .

LACAN, Jacques. O Seminário – livro 17 – O avesso da psicanálise.
LACAN, Jacques. O Seminário – livro 16 – de um Outro ao outro. 
Zizek, Slavoj. Um Mapa da Ideologia – Cap. Como Marx inventou o Sintoma.
Forbes, Jorge – Os eixos da subverção analítica: Os quatro discursos – texto disponível no site do Instituto de Psicanálise Lacaniana – IPLA
Scilicet – Os objetos a na experiência psicanalítica – AMP
Marx, Carl. O capital – Livro I.
Indart JC – Conferência em Curitiba.
Rafael Mariante Sallet
Fonte:http://praxisfreudiana.blogspot.com.br/2010/11/

Comentários